Cinco coisas sobre demissões em tempos de pandemia

Durante esses quase 90 dias de quarentena, pude acompanhar o processo decisório de alguns gestores sobre a redução de despesas e, consequentemente, do quadro de pessoal. Uns decidiram por não demitir, mesmo sacrificando um pouco o caixa da empresa. Outros optaram por demitir de imediato.

Compartilho pontos interessantes que observei e os convido a fazer uma breve reflexão sobre qual deve ser o nosso papel como líderes.

1. A maioria das demissões foi por performance

Muitos gestores me confessaram que os colaboradores que estavam sendo demitidos já vinham apresentando performance aquém do esperado ou tinham um histórico de relacionamento inadequado. Segundo eles, o corte não impactou a operação. Ou seja, os colaboradores já deveriam ter sido desligados.

Reflexão: Se esta diminuição do quadro não afetaria a operação e se os colaboradores não estavam sendo desenvolvidos com um prazo específico, por que os gestores demoraram tanto tempo para tomar essa decisão?

2. Gestores responsabilizaram a circunstância

Quando questionei como foi o processo de desligamento e o motivo alegado aos colaboradores pela demissão, os gestores me disseram que o argumento foi a retração na economia causada pela pandemia. Não apontaram nem a baixa performance e muito menos o tema de relacionamento inadequado. Confessaram que postergaram feedbacks, deixaram de lado conversas francas por acreditarem que as pessoas poderiam melhorar naturalmente.

Demitir pessoas nem sempre é fácil, mas deixá-las ir para o mercado sem um feedback claro não é correto: elas vão continuar errando sem saber em quais pontos podem melhorar.

Reflexão: Será que estamos fazendo o bem para uma pessoa, ao demití-la sem que ela saiba onde deixou a desejar?

3. Quem não foi demitido, ficou estressado.

Demissões coletivas sempre causam stress naqueles que ficam. Os que não foram demitidos sentem culpa pelos colegas que saíram e entram inconscientemente em pânico por não saberem se serão os próximos a serem desligados. A partir de uma certa intensidade, o stress é nocivo, libera alta quantidade de cortisol e causa baixa produtividade.

Reflexão: Se não for prioridade para o líder a saúde emocional do seu time, de quem será?

4. As demissões foram aos poucos

Em vez de desligarem todos de uma única vez, algumas empresas demitiram aos poucos. Em uma semana uns, na outra, outros, aumentando o sofrimento e a angústia de quem ainda não havia sido desligado.

Esse processo deixou alguns colaboradores paranóicos tentando interpretar sinais nos seus gestores para saber se eles seriam os próximos. Ficavam lendo comportamentos, do tipo: “Ela não me deu bom dia no WhatsApp, será que eu vou ser demitido?” ou “Ele não me agradeceu como sempre fez, será que eu estou na lista?”.

Um pensamento atribuído a Nicolau Maquiavel é: “O bem se faz aos poucos. O mal, de repente.”

Reflexão: Será que esse pensamento de Maquiavel também pode fazer sentido para liderança?

5. O time que ficou não foi reorganizado

Notei que não houve por parte dos gestores um tratamento profilático para aqueles que ficaram, no sentido de redistribuir os trabalhos e reorganizar a rotina. Uma redução de quadro tão significante exige uma gestão semelhante a de uma recontratação, começando tudo de novo, inclusive revendo processos.

Reflexão: Se o gestor não conduzir um processo de redefinição dos trabalhos, quem irá fazer?

Desculpability é, por definição, o hábito de dar desculpas, apontar culpados ou culpar as circunstâncias.

É o antivalor de Accountability. Esses dois conceitos são antagônicos, onde um está presente, o outro não entra. Em ambientes onde o pensamento de dono (Accountability) foi genuinamente incorporado, não cabem desculpas. Os efeitos nocivos da Desculpability são enormes e provocam no gestor até dez comportamentos absolutamente incompatíveis com a liderança. Como por exemplo, culpar as circunstâncias – no caso a pandemia – em vez de dizer que ele, gestor, é quem está insatisfeito com a performance ou com o comportamento; faltar com a franqueza, como omitir dos colaboradores feedbacks francos; e procrastinar, postergando demissões por acreditar que as pessoas vão melhorar “naturalmente”.

Desculpability confunde a mente do gestor fazendo com que ele atue mais no modo gerente, administrando coisas, do que no modo líder, desenvolvendo as pessoas.

Situações de crise como guerras, pandemias e recessões econômicas são momentos que sempre acabam revelando o pior e o melhor no ser humano. Virtudes morais como Accountability podem nos ajudar muito na nossa evolução como pessoas e como líderes.

JOÃO CORDEIRO

Um evangelista da Accountability, com a profunda convicção de que é dever de cada um tomar para si a responsabilidade pelo resultado do seu trabalho e como somos o resultado de nossas próprias decisões, podemos sempre melhorar.

NOTÍCIAS RELACIONADAS

Cadastre-se e receba nossos insights e conteúdos exclusivos.

Fale com a gente Fale com a gente